terça-feira, 23 de dezembro de 2008

Helena

- Mamãe, o que é o amor?
Pedro costumava fazer perguntas inesperadas. Helena achava "uma gracinha", e contava a todas as vizinhas que seu filho de sete anos perguntava "coisas lindas sobre a vida". Seu rosto iluminou-se como das outras vezes que Pedro arriscava fazer uma pergunta desse tipo a ela. Parou de costurar para responder-lhe.
- O amor é quando a gente gosta muito do outro, Pedro.
Uma resposta simplificada. Uma criança de sete anos não precisa saber mais do que isto: o resto, a vida encarregaria-se de mostrar a ele. Ou não.
- Mamãe, você já teve amor?
- Já.
A resposta saiu trêmula e rastejante.
- Por quem?
- Pelo papai, Pedro.
Pausa. Olhos desencontrados.
- O amor dura quanto tempo? - indagou Pedro.
- Não sei. Vai brincar na sala, vai.
Pedro, parecendo satisfeito com a pseudo-resposta, saiu em direção aos brinquedos jogados no meio da sala de estar. Enquanto montava o Lego no tapete da sala, Helena juntava as peças de sua vida.
O amor significaria a mesa da sala de jantar posta, a casa arrumada, a roupa lavada?
O amor era o anel no dedo anular?
Se assim fosse, Helena era toda amor. A realidade quebrou a janela como faria uma pedra do jardim. Estilhaços de vidros voaram para todo lado.
O rosto de Helena apagou-se junto com a noite, para além da janela do quarto.
O amor fugira há tempos daquela casa.
- Deixa pra lá.
Voltou a coser sapatinhos de lã. Com amor ou não, o fato era somente um: outro Pedro estava por vir.

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