domingo, 28 de novembro de 2010

Sapatinhos de princesa

Quinta-feira, tarde de muita chuva e vento.
O dia (noite?) nublado, quase que leva meu guarda-chuva.
O abrigo - a loja de sapatos - parece suficiente.
Fico um pouco por ali com a esperança de que pelo menos a ventania dê uma trégua.
Assim também pensou um certo senhor que dirigia um carrinho de mão
cheio de tapecerias de lã, linho, e outras fábricas mais.
Provavelmente com medo de que a água estragasse seus materiais
alguns da cor creme, com listras vermelhas ou azuis,
encostou ele na loja de sapatos - meu também abrigo temporário.
Lançando seus olhos para dentro da loja
como quem procurasse nada, mas nada mesmo,
avistou alguns sapatinhos infantis
em promoção: "apenas 29,99", era o que dizia a placa.
Apostando na sorte e na vista que possuia,
deixou suas tapecerias no espaço coberto
e seguiu para o estande de sapatos infantis.
Levou às mãos um pequeno tênis rosa e lilás
adornado com desenhos de flores e borboletas.
Olhando mais de perto, poderia imaginar sua filha calçando-o.
Ao redor, uma mãe colocava o sapatinho em sua pequena
e sem maiores problemas, decidiu levá-lo.
O nosso homem, das tapecerias importadas e quase secas,
observava a pequena criança pirilampiando pela loja
como se àquele ambiente fosse familiarizada.
Fixando seus olhos para os sapatinhos rosa e lilás,
o homem pensava nos 29,99 que não tinha para presentear sua pequena princesa
que estaria agora em casa brincando com a última boneca de pano
da última doação da última reciclagem
para a última favela do último bairro de São Paulo
na última divisa entre o Estado e o Planeta Terra.
Afastando-se dos sapatinhos, seguiu em direção a seu carrinho.
Apertou seus pequenos olhos, engatou na chuva perguntando-se em voz alta:
"Será que não para de chover?".
E mal sabia ele
que bem sabia eu
dos pingos da chuva
que misturavam-se
paulatinamente
com seu pranto.

3 comentários:

Sr. Reticente disse...

Que feliz por te motivar... Já estava até me perguntando se não era mais um caso de abandono bloguiano!! Feliz por te possibilitar fazer as pazes com a poesia!! Sigo seguindo!

Abração e ótima semana!

:o)

Sr. Reticente disse...

Ah, inclusive, que texto hein?! Que triste também... Ser testemunha de uma situação dessas nos obriga a tomar alguma atitude, nem que seja fazer poesia!

Outro abração!

Antônio Sozinho disse...

Que lindo, Fe!